Acontece, Artigo

Como definir e falar sobre contratos e remuneração em autogestão?

por Henrique de Sá Alves, colaborador da ASEc+ que contribuiu ativamente na criação do 3C, o Círculo de Contratualizações da ASEc+

Se desmorono ou se edifico; Se permaneço ou me desfaço; Não sei, não sei; Não sei se fico ou passo (trecho do poema Motivo, de Cecília Meireles)

Como em muitas organizações do terceiro setor, a tomada de decisão sobre os contratos dos colaboradores e remuneração é feita por um número reduzido de pessoas. Na ASEc+, por boa parte dos anos em que estive aqui, não era diferente: eu enquanto Coordenador Financeiro junto com a Juliana Fleury, CEO da organização, trocávamos informações e tomávamos as decisões nessa área.

Com a decisão da Juliana de irmos em direção da autogestão (segundo artigo dessa série) e com a entrada do Eric na ASEc+ (parte dessa história pode ser lida no primeiro artigo), a importância e a necessidade de explicitarmos esses processos para o restante da organização era trazida constantemente ao longo dos últimos anos – especialmente em 2021 e 2022. Nessas conversas algumas pessoas da organização – incluindo eu mesmo – viam na transparência um grande desafio, seja porque não parecia haver um processo estruturado, ou porque poderia desencadear desconfortos e até suscetibilidades na equipe.

Mesmo com esses receios, fomos caminhando enquanto construíamos esse caminho. A partir de 2023, passamos a contar com o apoio da Target Teal, a qual acelerou essas mudanças e nos ajudou a partir das nossas tensões criativas– algo que está diferente do que eu gostaria que estivesse na organização – para edificar novos processos e modificar a estrutura.

Nesse movimento, estávamos em agosto de 2023 e uma nova colaboradora, após 3 meses de organização, me procura querendo orientações de como alterar seu tempo de dedicação para ASEc+ e, consequentemente, seu contrato. A resposta que eu pude dar a ela naquele momento é que não tínhamos um processo definido para essa alteração. Logo após dar essa resposta, percebi em mim uma tensão criativa. Eis aqui o embrião do que viria se tornar o 3C – Círculo de Contratualizações com Colaboradores.

Do momento do surgimento dessa tensão, até a criação do 3C, houve muito trabalho: a criação e dissolução de um Círculo de Alocação de Recursos, reuniões para criar os primeiros esboços do que viriam a se tornar os combinados (o que internamente chamamos de “Restrições”), um Ritual estratégico sobre remunerações pra ouvir retornos dos colaboradores sobre os esboços criados, dentre outras reuniões.

Com o propósito de estabelecer relações de trabalho saudáveis entre a ASEc+ e seus colaboradores, o 3C toma hoje decisões por consentimento que envolvem remuneração, contratação e desligamento de colaboradores.  Ele é composto por um papel financeiro, representantes de todos os sub-círculos do Círculo Geral e dois representantes dos colaboradores (sendo um facilitador programático e um entre papéis transversais). Além dos papéis essenciais de facilitador e secretário, os quais não participam da tomada de decisão. Essa composição tem como objetivo ampliar a análise e buscar um senso de justiça, por meio de transparência e comunicação clara, em substituição ao tradicional modelo chefe-subordinado.

O 3C já está funcionando há mais de 6 meses, com vários processos definidos e muitos aprendizados. Enquanto colaboradores numa organização autogerida, seguimos desmoronando e edificando processos a partir de tensões criativas, num refazer-se contínuo guiado pelo olhar atento ao que nos acontece dentro e fora da organização.

Você tem dúvidas ou experiências sobre o assunto? Deixe nos comentários para continuarmos essa conversa!